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Já eram quase 2h30 da madrugada nesta terça feira (20/5/14), tinha
acabado de descer do ônibus, que me trazia de Florianópolis, vindo de uma Roda
de Conversa do ICJ (Instituto Catarinense de Juventude). Falávamos na roda de conversa em São José sobre os direitos
da juventude, direitos negados e as reivindicações.
Saia da rodoviária de Criciúma em direção à prefeitura
municipal, onde estava meu carro, na Cáritas Brasileira, onde trabalho. Pelas imediações da Esucri observei que dois
rapazes vinham em minha direção. Eles estavam meios que parados próximos a
alguns trapos e cobertores. Ambos estavam mau vestidos, sandália de dedo e sujos. Sempre falei que tomar banho é um ato político,
como tomada de decisão e opção que o banho fazia bem a pessoa que o toma e aos
que o circundam. Esquecia de mencionar que as vezes os atos políticos são negados.
Somente um jovem falou, não sei definir a idade dele, pois
sem dúvida o uso das drogas envelheceram seu rosto com anos a mais de sua idade cronológica
real. Falando da moratória vital, as drogas retiram cruelmente a moratória vital
que temos. Talvez o prazer exaltado do momento com o entorpecente cobra um preço
caro, o da retirada da vitalidade humana.
O jovem, que nada carregava nas mãos sujas, era o oposto do jovem calado, que
carregava um pedaço de madeira. Educadamente o jovem falante me abordou e trouxe sua mão no sentido de me saudar. Apertei a mão do jovem, um aperto de mão
desconfiado, da minha parte e da dele, pois ele não apertou com força. Ao dirigir
a palavra após a saudação me disse: “O irmão tu mora por aqui?”. Respondi
rapidamente que sim, sem querer dar informações. Logo ele disparou que eu
deveria estar voltando do trabalho.
Sem muita delongas lançou uma afirmação (que por sinal não
era verdadeira): “eu sei que tu tem dinheiro aí, tais aí com uma camisa bacana
(uma camisa de flanela xadrez), então dá uma ajuda, vamos socializar”. Sim, ele
terminou a frase com um “vamos socializar”. Pensei, quer dizer...Não pensei
muitas coisas, não sabia se aquilo era um assalto ou somente um pedido de
dinheiro. Mas isso não importa, pois não era possível dizer “não, não vou dar”. Coloquei
a mão no bolso e vi que tinha R$ 10 e algumas moedas, que não sei o valor, soltas no bolso. Logo retirei e entreguei a grana. O jovem apanhou o dinheiro e
disse: “boa sorte aí irmão, estamos todas na mesma”. Afirmei com uma frase, fazendo menção que a vida não está fácil para ninguém. Logo fiz questão de
continuar o meu caminho, sem olhar pra trás ou evidenciar qualquer receio.
Nunca tinha sido assaltado, na verdade, nem sei se foi um
assalto. Mas o que me prendeu o olhar desde primeiro momento foi às condições daqueles
dois jovens, eram trapos humanos, estigmatizados e dominados pelo vício, sem
dúvida, em estado lastimável de vida. E junto com o estado das condições deles
o pedaço de madeira que o jovem calado carregava na mão esquerda. Não perdi nem
celular, nem documentos e nem muito dinheiro. Creio que aquilo era o bastante para
algumas pedras a mais...
Porém a violência que bate a porta me intimidou, o medo de
ser agredido, o medo de sofrer agressão física, o medo... Violência esta que
poderia ser resposta a violência já impregnada naqueles jovens, já estavam os
dois em condições de violação, foram eles atacados com a violência antes de
mim. De fato, não sofri violência, o que ficou foi o medo da violência.
Não sei se fui assaltado ou a realidade de nosso estado de barbárie
e brutalidade bateu a minha porta, colocando o medo em minha rotina e retirando
a zona de conforto. Aquela frase, “vamos socializar”, me incomodou mais ainda,
por que mais que eu pouco tenho, é de socialização que precisamos. A desigualdade
social que se achega e mostra a cara despida de moralismo e discursos em salas
de aula, a desigualdade que deixa de ser
um índice e passa a ser um rosto que se apresenta pedindo seu lugar no mundo...
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